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Erro Médico ou Complicação Inerente? Como Diferenciar e Evitar Conflitos Jurídicos

A prática médica está intrinsecamente ligada a riscos e incertezas, já que os resultados de tratamentos e intervenções podem variar significativamente entre os pacientes. Contudo, em situações onde algo não sai como planejado, surge uma questão fundamental: trata-se de um erro médico ou de uma complicação inerente? Essa distinção não apenas tem implicações jurídicas, mas também éticas e profissionais.

Erro Médico ou Complicação Inerente? Como Diferenciar e Evitar Conflitos Jurídicos.

Neste artigo, vamos analisar as nuances entre erros médicos e complicações inevitáveis, apresentar exemplos práticos e oferecer orientações jurídicas para evitar conflitos, utilizando termos-chave como “responsabilidade civil médica”, “judicialização da saúde” e “complicações médicas inevitáveis”.

Erro médico: o que é e como ocorre?

Erro médico é uma falha evitável cometida pelo profissional de saúde durante o diagnóstico, tratamento ou execução de procedimentos. De acordo com o Código Civil Brasileiro (art. 186), para que o erro seja caracterizado juridicamente, é necessário comprovar a negligência, imprudência ou imperícia do médico, além do nexo causal entre a conduta e o dano.

Exemplos de erro médico:

  • Negligência: Não realizar exames essenciais antes de prescrever um tratamento.
  • Imprudência: Realizar um procedimento cirúrgico arriscado sem seguir protocolos.
  • Imperícia: Falta de habilidade técnica ao executar um procedimento.

Esses casos geralmente ocorrem devido à falha no cumprimento dos padrões técnicos e éticos da profissão.

Complicações inerentes: quando o risco é inevitável

Complicações médicas são eventos adversos que podem ocorrer mesmo quando o médico segue todos os protocolos adequados. Esses eventos são considerados inerentes à prática médica e fazem parte dos riscos conhecidos de determinados procedimentos.

Exemplos de complicações inevitáveis:

  • Reações alérgicas imprevistas a medicamentos.
  • Infecção hospitalar resistente a tratamentos padrão.
  • Rejeição de órgãos em transplantes, mesmo com todas as medidas preventivas.

O ponto central é que complicações inerentes não configuram erro médico, mas podem gerar conflitos se não forem devidamente esclarecidas ao paciente antes do tratamento.

Como diferenciar erro médico de complicação inevitável?

A distinção entre erro médico e complicação inerente pode ser desafiadora e, muitas vezes, depende de análises técnicas e jurídicas. Aqui estão os principais critérios utilizados:

  1. Adesão aos padrões de conduta: Verifica-se se o médico seguiu as diretrizes clínicas e éticas aplicáveis ao caso.
  2. Prova pericial: No âmbito judicial, especialistas médicos avaliam se o evento adverso poderia ter sido evitado.
  3. Consentimento informado: Se a complicação era um risco previsível e foi devidamente explicada ao paciente, há menos chances de ser considerada erro.
  4. Documentação médica: Um prontuário detalhado é essencial para demonstrar que o médico adotou todas as medidas recomendadas.
Imagem representando um Processo judicial por erro médico

Como evitar conflitos jurídicos?

Embora complicações sejam inerentes à medicina, a maneira como os médicos lidam com essas situações pode evitar judicialização e proteger sua reputação. Aqui estão algumas práticas recomendadas:

1. Fornecer consentimento informado completo

  • Explique ao paciente os riscos, benefícios e alternativas do tratamento.
  • Utilize termos claros e certifique-se de que o paciente compreendeu as informações.
  • Documente o consentimento por escrito.

2. Manter o prontuário médico detalhado

  • Registre todos os procedimentos, decisões clínicas e interações com o paciente.
  • Documente mudanças no estado clínico e intervenções realizadas.

3. Seguir protocolos e boas práticas

  • Atualize-se constantemente sobre diretrizes médicas e práticas baseadas em evidências.
  • Adote medidas preventivas para minimizar os riscos de complicações.

4. Comunicar-se com clareza e empatia

  • Informe o paciente imediatamente caso uma complicação ocorra.
  • Mostre empatia e esteja disponível para esclarecer dúvidas, o que pode reduzir a sensação de abandono e a intenção de judicialização.

5. Buscar suporte jurídico preventivo

  • Considere o acompanhamento de um advogado especializado em Direito Médico para revisar contratos, termos de consentimento e práticas administrativas.

Casos práticos e jurisprudência

Caso 1: Infecção hospitalar pós-cirurgia

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE ERRO MÉDICO. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DA AUTORA. INFECÇÃO APÓS CIRURGIA DE HÉRNIA DE DISCO. TRATAMENTO APLICADO ADEQUADO E PERTINENTE. CONSTATAÇÃO PERICIAL. AUSÊNCIA DE CONDUTA ILÍCITA POR PARTE DO MÉDICO E DO HOSPITAL. NEXO DE CAUSALIDADE INEXISTENTE. RESSARCIMENTOS PLEITEADOS INCABÍVEIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC. Acórdão. Processo nº 0012509-46.2013.8.24.0039; Relator (a): Jairo Fernandes Gonçalves; Data do julgamento: 10/04/2018.)

  • Fatos: Paciente desenvolve infecção após cirurgia. O hospital e o médico foram processados por erro médico.
  • Decisão judicial: Laudo pericial demonstrou que todas as medidas de assepsia foram adotadas, configurando complicação inerente.
  • Resultado: Improcedência do pedido da autora.

Caso 2: Diagnóstico errado de apendicite

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL. ERRO DE DIAGNÓSTICO MÉDICO. APENDICITE.  CERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINAR REJEITADA. DIAGNÓSTICO RETARDADO. CONFIGURAÇÃO. NEGLIGÊNCIA RECONHECIDA. DEVER DE INDENIZAR.

Hipótese em que, restou configurada a conduta negligente por parte dos profissionais da medicina do Centro Clínico Canoas, uma vez que possibilitaram a evolução do problema para um caso de apendicite aguda com peritonite, bem como restou comprovado que houve diagnóstico prematuro e incorreto frente ao quadro clínico do paciente na clínica em questão, sendo inconteste o erro de diagnóstico, já que o autor, quando procurou a clínica para seu primeiro atendimento, já apresentava  um quadro inicial de apendicite.

Caso em que, não havendo culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, evidenciado está o dever de indenizar do Centro Clínico Canoas Ltda., porquanto restou comprovado que houve falha na prestação dos serviços, bem como preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil. No que tange ao quantum indenizatório, o valor deve demonstrar-se suficiente à devida reparação, não configurando assim, o enriquecimento ilícito, tampouco valor ínfimo aos danos morais suportados pelo autor. APELAÇÃO PROVIDA. (TJRS. Acórdão. Processo nº 70036098655;.  Relator (a): Roberto Carvalho Fraga; . Data do julgamento: 20/07/2011)

  • Fatos: Paciente foi diagnosticado com apendicite e submetido a cirurgia desnecessária.
  • Decisão judicial: Perícia constatou negligência no exame clínico, configurando erro médico.
  • Resultado: Indenização ao paciente.

Conclusão

Distinguir erro médico de complicações inerentes é essencial para garantir justiça nos conflitos envolvendo a prática médica. A adoção de boas práticas, comunicação clara e documentação adequada são ferramentas fundamentais para médicos que desejam minimizar riscos jurídicos.

A medicina é uma ciência que combina arte e técnica, e é inevitável que situações adversas ocorram. Contudo, compreender as nuances entre erro médico e complicações médicas inevitáveis ajuda a proteger tanto os profissionais quanto os pacientes, promovendo confiança e segurança na relação médico-paciente.

Bibliografia de Referência

  1. BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: www.planalto.gov.br.
  2. Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução nº 2.217/2018 – Código de Ética Médica. Disponível em: www.portal.cfm.org.br.
  3. FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
  4. BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade Civil nas Atividades Médica e Hospitalar. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
  5. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 30ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
  6. SILVA, João Luiz de Moraes. Responsabilidade Civil e Penal do Médico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2020.
  7. GOMES, Orlando. Responsabilidade Civil. 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
  8. SCHREIBER, Anderson. Responsabilidade Civil: Uma Perspectiva Minimalista. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2021.
  9. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
  10. Manual de Orientação Ético-Profissional do CFM. Conselho Federal de Medicina. Disponível em: www.portal.cfm.org.br.